Nonô sente a máquina passar pela sua cabeça.
A capa, apertada no pescoço, faz seu rosto ficar vermelho.
A alergia a poliéster é algo que gostaria de não ter.
Começa a sentir frio em sua nuca, algo nunca sentido antes.
Parece que lhe falta algo.
Algo que sempre teve e nunca pensou a respeito da sua importância.
Esteve pronto para mudar, mas as circunstâncias talvez tenham pesado em sua consciência.
Mas agora já é tarde.
O preço da impulsividade.
Sabe que sua escolha foi errada, está triste e desapontado consigo mesmo.
Mas não sai do lugar, fica ali, sentado, submisso perante sua inércia.
Sente seu passado cair sobre os ombros.
Os olhos começam a produzir uma pequena quantidade de lágrimas, mas algo insuficiente para uma queda brusca em sua face.
Tem vergonha, não faria ali.
Mas com certeza fará quando estiver a sós.
A navalha passa em seu pescoço, mas não sangra.
O corte é profissional e apenas arranca os pelos inferiores de sua barba.
Nonô não se reconhece.
Jamais seria capaz de fazer isso consigo mesmo.
Mas é inútil lutar contra a realidade.
“Prontinho, chefe, gostou da mudança de visual?”
Não há palavras para o que sente.
“Ficou ótimo”